Pai José era o
Tatá-Corongo-em-Chefe das falanges dos guerreiros capoeiras do Vale do Paraíba,
sua fama de líder transcendeu as senzalas e chegou ao conhecimento dos brancos.
Depois do levante liderado pelo Pai Manoel Congo, os senhores passaram a
perseguir os tatás. Pai José encontrava-se de castigo amarrado ao tronco, ele
havia apanhado muito e estava com fome e com sede. O feitor não permitia que
ninguém se aproximasse para dar auxílio ao Pai José.
As idéias
abolicionistas que circulavam com força na corte, também já haviam chegado à
região do Vale do Paraíba, trazidas pelos sinhozinhos que foram estudar fora e
depois retornaram para as fazendas. A notícia do martírio de Pai José correu a
região e comoveu os jovens abolicionistas, que resolveram ajudá-lo.
Que Pai José
tinha de ser liberto do castigo, isso era uma certeza, mas como livrá-lo, já
que estava sob vigilância dia e noite.
Sinhazinha,
nunca saiu para estudar fora da fazenda, mas desde muito pequena, nunca gostou
que se judiasse dos pretos. Ela resolveu apoiar os abolicionistas no resgate de
Pai José.
O plano,
qualquer que fosse, tinha de ser elaborado e executado com urgência, pois, Pai
José não agüentaria sobreviver àquela tortura por muito tempo.
À noite,
somente um homem ficava vigiando Pai José. Seria o momento adequado para a
operação? Porém, as coisas não eram tão
fáceis assim. O senhor havia deixado recomendações expressas para que ninguém
se aproximasse.
Mariana
Crioula descumpriu as ordens do senhor e foi até ao local, levando uma janta
para o homem que vigiava Pai José. A comida estava bem preparada, com bastante
sonífero, até a garapa continha um pouco da droga. O homem ao ver aquele prato
bem feito e saboroso, não resistiu, aceitou, comeu, empapuçou-se, lambeu os
beiços e caiu em sono profundo.
Sinhazinha, que
estava de tocaia, coberta com um manto azul celeste para não ser reconhecida,
aproximou-se e pegou as chaves no bolso do colete do homem, abriu o cadeado das
correntes que aprisionavam Pai José. Um grupo de abolicionistas levou-o sob
escolta em segurança.
O homem
despertou e viu uma silhueta de uma mulher coberta com um manto azul e as
correntes abertas, sem a presença de Pai José. Contudo, ele estava muito grogue
e não tinha condições para reagir.
No dia
seguinte, o reboliço estava formado. O senhor queria saber quem havia libertado
Pai José. O homem, pressionado, achou melhor não revelar ao patrão que havia
sido uma mulher coberta por um manto azul, pois certamente, o senhor o
castigaria com demissão ou coisa ainda pior. Ele resolveu dizer.
- Foi Nossa
Senhora!
O senhor muito
intrigado. – Nossa Senhora? Ela não iria gastar o seu tempo ajudando negros. O
homem insistiu e voltou a afirmar.
- Foi Nossa
Senhora, sim patrão! Ela usava um manto azul e libertou Pai José, diante dos
meus olhos.
O homem levou
o chapéu ao peito em reverência a santa. O senhor encarou-o, pois não estava
completamente convencido.
- Nossa
Senhora e Pai José seguiram em qual direção?
- Eles não
foram para lado algum senhor, desapareceram na escuridão da noite. Eu nem
me atrevi atentar contra Nossa Senhora, pois quero que ela interceda por mim no
dia do juízo.
Diante de tamanha
convicção do homem, o senhor, que também era devoto de Nossa Senhora, resolveu
acreditar e aceitar a perda do escravo, tanto que ele nem acionou o
capitão-do-mato para realizar a busca e a captura do negro sumido, dando o caso
por encerrado. O fazendeiro, no Vale do Paraíba, era senhor de café e de gente.
Todavia, no plano celeste, certamente, careceria da interseção de Nossa Senhora
e não seria nada sábio arranjar uma demanda com a santa.
Foi desse
jeito, com o apoio dos abolicionistas, da sinhazinha e a interseção de Nossa
Senhora, que Pai José livrou-se do castigo, foi liberto do cativeiro e foi
viver livre e feliz no quilombo de Pai João de Angola.
Edenir Santos
13, de maio de 2012
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