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terça-feira, 8 de maio de 2012

Um “causo” do Vale do Paraíba para o treze de maio.




Pai José era o Tatá-Corongo-em-Chefe das falanges dos guerreiros capoeiras do Vale do Paraíba, sua fama de líder transcendeu as senzalas e chegou ao conhecimento dos brancos. Depois do levante liderado pelo Pai Manoel Congo, os senhores passaram a perseguir os tatás. Pai José encontrava-se de castigo amarrado ao tronco, ele havia apanhado muito e estava com fome e com sede. O feitor não permitia que ninguém se aproximasse para dar auxílio ao Pai José.

As idéias abolicionistas que circulavam com força na corte, também já haviam chegado à região do Vale do Paraíba, trazidas pelos sinhozinhos que foram estudar fora e depois retornaram para as fazendas. A notícia do martírio de Pai José correu a região e comoveu os jovens abolicionistas, que resolveram ajudá-lo.

Que Pai José tinha de ser liberto do castigo, isso era uma certeza, mas como livrá-lo, já que estava sob vigilância dia e noite.

Sinhazinha, nunca saiu para estudar fora da fazenda, mas desde muito pequena, nunca gostou que se judiasse dos pretos. Ela resolveu apoiar os abolicionistas no resgate de Pai José.

O plano, qualquer que fosse, tinha de ser elaborado e executado com urgência, pois, Pai José não agüentaria sobreviver àquela tortura por muito tempo.

À noite, somente um homem ficava vigiando Pai José. Seria o momento adequado para a operação?  Porém, as coisas não eram tão fáceis assim. O senhor havia deixado recomendações expressas para que ninguém se aproximasse.

Mariana Crioula descumpriu as ordens do senhor e foi até ao local, levando uma janta para o homem que vigiava Pai José. A comida estava bem preparada, com bastante sonífero, até a garapa continha um pouco da droga. O homem ao ver aquele prato bem feito e saboroso, não resistiu, aceitou, comeu, empapuçou-se, lambeu os beiços e caiu em sono profundo.

Sinhazinha, que estava de tocaia, coberta com um manto azul celeste para não ser reconhecida, aproximou-se e pegou as chaves no bolso do colete do homem, abriu o cadeado das correntes que aprisionavam Pai José. Um grupo de abolicionistas levou-o sob escolta em segurança.

O homem despertou e viu uma silhueta de uma mulher coberta com um manto azul e as correntes abertas, sem a presença de Pai José. Contudo, ele estava muito grogue e não tinha condições para reagir.

No dia seguinte, o reboliço estava formado. O senhor queria saber quem havia libertado Pai José. O homem, pressionado, achou melhor não revelar ao patrão que havia sido uma mulher coberta por um manto azul, pois certamente, o senhor o castigaria com demissão ou coisa ainda pior. Ele resolveu dizer.

- Foi Nossa Senhora!

O senhor muito intrigado. – Nossa Senhora? Ela não iria gastar o seu tempo ajudando negros. O homem insistiu e voltou a afirmar.

- Foi Nossa Senhora, sim patrão! Ela usava um manto azul e libertou Pai José, diante dos meus olhos.

O homem levou o chapéu ao peito em reverência a santa. O senhor encarou-o, pois não estava completamente convencido.

- Nossa Senhora e Pai José seguiram em qual direção?

- Eles não foram para lado algum senhor, desapareceram na escuridão da noite. Eu nem me atrevi atentar contra Nossa Senhora, pois quero que ela interceda por mim no dia do juízo.

Diante de tamanha convicção do homem, o senhor, que também era devoto de Nossa Senhora, resolveu acreditar e aceitar a perda do escravo, tanto que ele nem acionou o capitão-do-mato para realizar a busca e a captura do negro sumido, dando o caso por encerrado. O fazendeiro, no Vale do Paraíba, era senhor de café e de gente. Todavia, no plano celeste, certamente, careceria da interseção de Nossa Senhora e não seria nada sábio arranjar uma demanda com a santa.

Foi desse jeito, com o apoio dos abolicionistas, da sinhazinha e a interseção de Nossa Senhora, que Pai José livrou-se do castigo, foi liberto do cativeiro e foi viver livre e feliz no quilombo de Pai João de Angola.

Edenir Santos
13, de maio de 2012

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